Sobre imitar

Imito tanto os livros de que gosto já enquanto os leio que chegando ao fim passo a achar que são eles que estão me plagiando.

A Cadeira

A Cadeira. Madeira e aço. 2012.

Na conjunção do espaço[1] com o tempo[2], a obra[3] subjaz a ausência[4] do artista[5] à experiência subjetiva[6] do espectador[7]. Os signos[8] assim representados[9] trazem à tona[10] o vazio[11] contido em sua história[12].

[conto escrito no 1º dia do curso-laboratório De Repente É Bom Ter Um Objetivo, sobre a OuLiPo, realizado na Oficina Cultural Oswald de Andrade; revisado para o blog]

[1] A obra, a princípio prevista para instalação num cubículo, foi movida para um pavilhão de 10 x 10 m, mediante exigência do artista.

[2] Originalmente comissionada para 2010, a obra só se materializou em 2012, após múltiplas ameaças por parte do museu de cancelamento do edital. O artista, de boina e sobretudo, trouxe à recepção do museu em punhos próprios uma cadeira. Seu modelo era um de produção em massa facilmente encontrável em lojas de móveis.

[3] O artista previa, para desespero do diretor do museu, ficar sentado durante seis meses na cadeira, ali vivendo enquanto se alimentava, dormia e fazia todas suas necessidades, inclusive criando no meio-tempo novas obras, plásticas e/ou performáticas.

[4] Avisado que tal performance não seria aceita, o artista largou a cadeira no pavilhão e marchou museu afora, não voltando sequer para o coquetel de inauguração.

[5] Subsequentemente, avisou por carta à direção que ele faria questão de ainda realizar a performance tal como havia planejado, nem que tivesse que permanecer na calçada defronte ao museu, noutra cadeira do mesmo modelo.

[6] Pleonasmo inevitável de curadoria.

[7] Filas se formaram onde todos se indagavam quanto à simbologia ali contida. Os mais incautos chegavam a sentar na obra, tirando selfies que eram devidamente compartilhadas com a hashtag #sentei.

[8] Não-astrológicos, naturalmente.

[9] Isto é, pela cadeira sem dono.

[10] Ou ao menos assim o diretor do museu desejava.

[11] Vazio que se contrapunha ao não-vazio do artista sentado na calçada, apertando a mão de transeuntes e posando para fotos sem se levantar em troca de marmitas e sacolas plásticas, essas últimas utilizadas para contenção das necessidades fisiológicas.

[12] Que foi registrada em múltiplas versões: a oficial, do museu, e todas as outras, as orais, transmitidas aos colegas de trabalho e familiares por aqueles que trocaram dois minutos de conversa com o artista.