Algumas cenas em Winnipeg (I)

Na praça de alimentação, uma mulher de feição oriental chegou com o olho direito roxo por trás dos óculos. Tinha perfeitamente a aparência de quem tinha levado um soco. Ficou em pé conversando com as amigas, também orientais, que estavam sentadas. Depois se sentou também. Um guarda de segurança do shopping veio, depois outro. Ambos caucasianos. Passaram um bom tempo conversando com todas. Ao final, a mulher do olho roxo e os guardas se retiraram, enquanto as outras permaneceram onde estavam, sem parecer demasiado tensas ou preocupadas. De onde eu estava, não pude ouvir quase nada do que falaram.

Estava numa noite esperando o ônibus nas gaiolas de vidro que existem em vários dos pontos de ônibus da cidade. Não são aquecidas, mas ao menos protegem do vento. Lá dentro havia um homem negro muito magro caminhado lentamente da extremidade direita da gaiola (onde eu estava) até o meio dela. Um passo por vez. Ao chegar no meio, voltava a caminhar rumo à extremidade direita. E assim por diante. Após algum tempo, chegou o ônibus dele, o que o fez finalmente correr. Quase todas as outras pessoas que estavam na gaiola também saíram para pegar este ônibus. Ficamos apenas eu e outro homem, sentado no canto oposto ao meu. Ele olhou para mim e perguntou se eu tinha algum trocado. Disse que não. Ele agradeceu, disse que iria rezar por mim e saiu da gaiola, segurando a sua placa de papelão.

Voltar para casa bêbado à noite pode levar a alguns pensamentos que nunca tinha imaginado. Sem carro, o que por si só seria um perigo nesta situação, as opções são aplicativo ou ônibus. Ao contrário de São Paulo, aqui pode ser difícil encontrar um carro por aplicativo a depender da hora e local. Tive que pegar ônibus. Ao fim deu tudo certo, mas enquanto caminhava rumo ao ponto num vento de no mínimo (no máximo) -10 oC com direito a neve, não resisti a imaginar que cair de bêbado na rua naquela situação (o que nunca aconteceu comigo, estando sozinho) acarretaria num sério risco à minha saúde.
Também pensei em muitas outras coisas no caminho, enquanto devaneava com o frio, a neve, o álcool, a vida e a morte, mas daquelas tenho dificuldade agora de me recordar.

2 comentários sobre “Algumas cenas em Winnipeg (I)

  1. Parabéns Meu Filhão, mesmo distante, mas adoro degustar seus inteligentes contos e histórias. Beijão

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